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domingo, 29 de maio de 2016

ARTIGO: PEDAGOGIA SOCIAL: CONTRIBUIÇÃO À SUA AFIRMAÇÃO

PUBLICADO NA REVISTA PEDAGOGIA SOCIAL - RPS - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE: http://projetopipasuff.com.br/revista/edicao1.php

PEDAGOGIA SOCIAL: CONTRIBUIÇÃO À SUA AFIRMAÇÃO 
Jacy Marques Passos 

RESUMO: A Pedagogia Social existe desde a antiguidade. No século VI, na Grécia antiga, trabalhava-se o conceito sem a utilização do termo. O percurso histórico explica porque atualmente a disciplina científica Pedagogia Social, ocupa hoje um lugar fundamental no seio das ciências da educação. Essa amplitude possibilita sua afirmação em contextos formais, não formais e informais, respondendo inclusive por um universo multidisciplinar. O alicerce histórico, que embasa esse capital cultural, carrega intrínseco à sua afirmação, aplicação, a reflexão, espaços de debates e a problematização que lhe é peculiar. A relação educador x educando, demanda questões transversais que permeiam décadas e recrudesce a urgência em quebrar paradigmas de metodologia mecanicistas e liberal de educação. Tais demandas apontam para a desconstrução dos modelos que provaram sua ineficácia no processo ensino aprendizagem. No seio da escola, é possível notar não somente o dualismo e a violência simbólica mas também práticas do passado - conteudista e de memorização - devido as resistências presentes nesse contexto. Vale ressaltar, no entanto, que a Pedagogia Social, na sua completude e amplitude, é holística, diferencia-se na relação educador e educando, efetivamente, ao se construir uma educação afirmativa e com resultados mais expressivos inerentes às suas práxis, diferentes daquelas do passado. Em seu aspecto epistemológico, na perspectiva de avanços significativos em conformidade conceitual, a Pedagogia Social, com suas especificidades e relevância histórica, contrapõe práticas do passado, e possibilita produzir essa reflexão com vistas à sua ressignificação,. Tal necessidade se torna premente quando entendemos que a Pedagogia Social, a partir de seus pressupostos, pode evidenciar a concernência social e política desta disciplina. A luta, não é exclusivamente por ela, mas por uma Educação Social, mais reflexiva, libertadora, problematizadora, com igualdade de oportunidades, deveres e direitos iguais para todos. Além disso, luta-se por uma educação plena, menos dualista, e sem violência simbólica, e que, na consciência do devir, recrudesça a transformação do educando cidadão, para que tenhamos uma sociedade mais justa, igualitária e com direitos e justiça social, em todas as áreas, em que paire o  respeito às leis com respeito ao ser humano como preconiza as Nações Unidas para a sociedade do século XXI. 
Palavra Chave: Pedagogia Social, Educação Formal e Educação não Formal    

INTRODUÇÃO 

Neste artigo procura-se descrever impactos positivos que a Pedagogia Social produz a partir de sua presença e afirmação nos contextos formais, não formais e informais. Por muitos anos, os precursores da Pedagogia Social desenvolveram atividades pedagógicas, em detrimento do aspecto social inerente à essa disciplina dificultando, assim, a visão da sua totalidade, pois seu foco era direcionado para uma ação que buscava cuidar do ser humano sob um determinado aspecto. Com o passar do tempo, a necessidade de percepção das necessidades se ampliou questionando-se as práticas mais pontuais que não tratava o educando de forma holística. 

Nesse contexto, faz-se necessário diferenciar as competências do Educador Social na educação, formal, não formal e informal e seu papel educativo nos marcos da Pedagogia Social. Além disso, é importante analisar a interface na mediação deste processo educativo com a escola, Instituições Sociais e Comunidade por meio da participação da sociedade civil organizada em estruturas colegiadas de interação entre as escolas e o território que a circunda. 
Em uma perspectiva inclusiva, é necessário buscar aprendizagens que movam as interações geradas pelo processo participativo nos espaços formais e não formais para que se possa debater a valorização do Profissional, Pedagogo/ Educador Social, da Educação em todos os níveis, seus campos de atuações, atributos e a relação com a Pedagogia Social. 

É necessário entender que a Pedagogia Social é ampla, não é neutra, e é o Campo da Pedagogia que se constrói, dialoga, transita e agrega sistematicamente os conhecimentos e saberes construídos do Serviço Social, Sociologia, Filosofia, Psicologia Social, Educação Social, Educação Comunitária, da Educação Popular defendida por Paulo Freire em seus diversos trabalhos, bem como os saberes de experiência produzidos pela humanidade. Entretanto, os saberes de experiência são importantes, mas não são suficientes, pois não carregam em si, a rigorosidade metódica necessária para que a ação não incorra em reducionismo.  

A defesa desse conjunto de conhecimentos, no contexto sócio histórico, deverá instrumentalizar o Pedagogo/Educador Social, para que ele valorize as interações sociais na sua práxis educativa  e no desenvolvimento das atividades e práticas. Estas práticas estão presentes em ambientes escolares e não escolares, como alternativas de construção de um fazer pedagógico social com possibilidades que objetivem formar cidadãos a partir do respeito a sua realidade, com sentido e significado nas dimensões educacional, artística, cultural e social.   

Assim, a Pedagogia Social, não objetiva moldar o cidadão à Sociedade, mas respeitar a sua história de vida no contexto em que estiver inserido. Ela existe e é plena, tem um olhar integral do educando, fundamentada no pressuposto de planejar e executar novas propostas que resultem em mudanças de paradigmas e transformação do indivíduo, e na consciência do devir, proporcionando a promoção dos direitos e deveres, além da autonomia e do senso crítico por meio de uma relação dialética e dialógica.   

Tendo como base a Pedagogia Social que se construa, sem violência, com liberdade em sua plenitude e avanços, impactos na sociedade e que se estenda para muito além dos muros institucionais (espaços escolares e não escolares) na qual o educando seja o protagonista da própria história. Nesse sentido, o nosso papel se fortalece na busca de valorizar, resignificar, lutar por igualdade e justiça social e, perpassa pela importância de ser um com o outro.  
  
A afirmação da Pedagogia Social, do ponto de vista ampliado, significará desenvolver habilidades e competências na área de intervenção social, que produzirão resultados positivos, relacionados às questões transversais, com respeito à realidade e a identidade sócio cultural, dos atores envolvidos (educando e do Pedagogo/Educador Social), numa ação articulada com as famílias nas Comunidades que os circundam. Traduz-se numa população de grandes vulnerabilidades sociais e relacionais, advindas de políticas sociais e educacionais entre tantas outras não ou mal implementadas, que atravessa gerações, e nesse percurso, o Pedagogo Social precisa ser um intelectual amoroso e afetuoso que fará toda a diferença na construção das práticas, ações e do fazer pedagógico.  

Rubem Alves (1989, p. 30), em seu livro Conversas com quem gosta de ensinar, nos provoca com a indagação “Educadores, onde estarão?” e continua: 
“Em que covas terão se escondido? Professores, há aos milhares. Mas professor é profissão, não é algo que se define por dentro, por amor. Educador, ao contrário, não é profissão; é vocação. E toda vocação nasce de um grande amor, de uma grande esperança.”    

Origem do termo Pedagogia e a origem da Pedagogia Social 

A origem da palavra Pedagogia nos remete, na perspectiva histórica, a Grécia antiga, que perpassa por momentos em que, as crianças atenienses iriam tornar-se cidadãos e eram preparadas para o debate e a deliberação. Nesse contexto tinham um dia de estudos e formação para a cidadania.  
As crianças se encaminhavam para a palestra, local onde estudavam, duas vezes ao dia: de manhã quando aprendiam música e ginástica, e à tarde, após o almoço em casa, para o ensino da leitura e escrita, que era acompanhado por um escravo chamado de pedagogo (aquele que conduz), termo que deu origem à palavra Pedagogia. 
  
A importância da Educação no desenvolvimento da Sociedade foi discutida por grandes filósofos da antiguidade clássica. Platão e Aristóteles, por exemplo, discutiram filosofia social por meio de questões éticas, políticas e pedagógicas. Percebe-se que historicamente a Pedagogia Social apoia-se na possibilidade verdadeira de influenciar os aspectos sociais por meio da educação.    

O conceito pedagogia social origina-se a partir do trabalho social e data de meados de 1900 (OTTO, 2009, pág.). A história aponta que seu enfoque científico é atribuído ao pedagogo alemão Friedrich Wilhelm Adolph Diesterweg (1790-1866), em 1850 (ver MACHADO, 2008). A primeira obra sistematizada é atribuída ao filósofo neokantiano Paul Gerhard Natorp (1854-1924), que vincula o processo de educação à comunidade (CALIMAN, 2008) 

O conceito de Pedagogia Social, em alguns países europeus, tem grande relevância para o desenvolvimento do trabalho social profissional. Na primeira década do século XX, mas especialmente a partir 1920, o educador alemão Herman Nohl (1879-1960) interpretou a Pedagogia Social como uma estrutura teórica hermenêutica para o trabalho social profissional. 

Embora o conceito de Pedagogia Social não tenha se consolidado efetivamente nos países anglo-americanos, muitas atividades associadas à Pedagogia Social podem ser encontradas nos países onde as necessidades e os problemas sociais são abordados a partir de pontos de vista pedagógicos. Os fundadores da Pedagogia Social não pretendiam criar um novo grupo de profissionais chamados Pedagogos Sociais. O termo foi usado inicialmente para referir-se às teorias da Educação e / ou a uma determinada área da Ciência da Educação (KRONEN, 1980). O conceito deu lugar a ideias oriundas da oposição a abordagens individualistas à Educação. A Pedagogia Social como conceito da teoria educacional e como campo de estudo originou-se como uma crítica da Educação focada no desenvolvimento dos indivíduos sem considerar as dimensões sociais da existência humana. 

As principais correntes de desenvolvimento da Pedagogia Social no alvorecer do Século XX foram influenciadas fortemente pela Antropologia filosófica. A concepção de assistência social empreendida através da Educação foi estudada desde o princípio, especialmente através do educador suíço Pestalozzi no fim do século XVIII (RAUSCHEMNBACH, 1999, p. 286).  
A partir dessa raiz paradigmática, a tradição alemã de Pedagogia Social foi desenvolvida de acordo com o marco conceitual da ciência educacional. Em termos histórico-sociais a origem da ação pedagógica social está firmemente ligada aos processos de industrialização e da urbanização, que evidenciaram novos problemas sociais com a fragmentação da sociedade agraria tradicional. Nesses processos, muitas crianças e adultos com necessidades de assistência foram negligenciados e novos problemas sociais se revelaram. A educação em suas diferentes formas foi vista como um mecanismo importante para enfrentar esses novos problemas, tanto dentro das famílias como nas comunidades.  

Como uma tradição de pensamento e de ação, a Pedagogia Social, é mais antiga do que o conceito ou o uso do termo. Os fundadores da tradição fizeram as perguntas corretas, embora não adotassem esse termo. Desde o princípio, a perspectiva pedagógico-social se dedicava a encontrar soluções educacionais para os problemas sociais. 

A Educação nos espaços institucionais 

Contextualizar sob o ponto de vista histórico, no Brasil e destacar os três períodos que tratam da trajetória percorrida pela criança e o adolescente no Brasil é de suma importância para entender como se deu o percurso e a influência da educação e do fazer pedagógico, nesses aspectos. 
No Brasil Colônia, a ideia de proteção e sentimento em relação a criança não existia, ou seja, as crianças eram consideradas animais que deveriam ter aproveitada sua força de trabalho enquanto durassem suas curtas vidas, ou seja, a expectativa de vida era de 14 anos de idade. Metade dos nascidos vivos morriam antes de completar os 7 anos de idade (PRIORE, 2000, p. 20). 

Meninas e meninos viviam em extrema pobreza, então, uma das alternativas encontradas nessa época para livrar as crianças da pobreza e consequentemente ganhar dinheiro, era entregá-los para a marinha. Enquanto os meninos pobres menores de 16 anos eram embarcados como grumetes e pajens nas naus portuguesas do século XVI. Desse modo, as órfãs do rei eram as meninas brancas, pobres, menores de 16 anos de idade, que tinham o pai falecido e eram utilizadas para venda, onde algumas eram virgens e outras prostitutas (PRIORE, 2000, p.33). 

A Companhia de Jesus, além das ordens missionárias, se encarregava de orientar na formação de crianças e adolescentes e influenciou muito na criação de colégio. Os padres tinham a difícil missão de perseverar os bons costumes, fazendo com que as crianças influenciassem seus pais na efetivação e implementação de tais condutas as crianças foram no Brasil, instrumento de propagação da fé cristã, ou seja, eram objetos de convencimento e influência aos pais e aos mais velhos. (CHAMBOULEYRON, 2000, p.63) 

Nas aldeias administradas pelos jesuítas, Mem de Sá mandara fazer tronco e pelourinho, que por sua vez eram utilizados sempre que as crianças ou adolescentes fugissem da escola. Embora o castigo físico fosse considerado “normal”, os padres tinham o cuidado de não o adotar pessoalmente, delegando a tarefa, de preferência, a alguém fora da companhia.  

No Brasil Império, em 1822, século XIX, marcado pela rígida divisão de classes, onde a nobreza descobriu a infância de suas crianças, mas os escravos terão que esperar algumas décadas para esse reconhecimento (CUSTÓDIO, 2009, p.11). 

A infância como etapa específica do desenvolvimento, no entanto, esta descoberta não significou imediatamente a valorização indistinta da criança como elemento prospectivo da humanidade. Antes disso, serviu para demarcar uma radical diferença de classe, privilegiando as crianças da elite mediante o reconhecimento de uma identidade própria e particular que se afirmou diante dos demais segmentos estigmatizados como órfãos, expostos, menores (MAUAD, 2000, p.25). 

Durante o império a criança e o adolescente foram ignorados, não tendo qualquer direito assegurado, sendo à exploração no trabalho frente ao modelo liberal que surgia em busca do progresso com a instauração da república. 
  
Quanto mais pobres, mais delinquentes, quanto mais delinquentes mais se recolhiam tais crianças, quanto mais se recolhia, mais se fazia elas trabalharem, quanto mais se trabalhasse, mais se enriquecia o país. 

Em 1888, a abolição da escravidão não viria significar a abolição da exploração das crianças no trabalho, mas substituir um sistema por outro. O trabalho infantil continuará como instrumento de controle social da infância e de reprodução social das classes, surgindo, a partir daí outras instituições fundadas em novos discursos. 

Com relação ao Brasil República, com a proclamação da república e a abolição da escravidão, crianças circulavam pelas cidades em busca de comida, casa, na total miséria. Porém, estas eram tidas como “baderneiras”, ou seja, a presença da pobreza incomodava a classe alta, pois tais crianças traziam consigo a “criminalidade”, furtando a beleza e a paz social (CUSTÓDIO, 2009, p14). 

Na “defesa da sociedade”, e como forma de “solucionar” esse “problema”, foi aprovado o código penal da República inserindo a criança num âmbito criminal, reduzindo sua condição na de marginal, objeto vazio de direitos. “A criança é o futuro do país”, nesses termos, tinha-se que corrigir suas condutas e ações enquanto fosse tempo para que no futuro esta criança se tornasse um bom e honesto adulto” o Estado com base em tal objetivo acabou construindo uma prática de intervenção sobre a criança pela via da criminalização, inaugurando o modelo menorista. 

Importante destacar o ano 1927, emblemático e Carregado de conteúdo moral, surgindo para resolver os ditos “incômodos da delinquência” e ignorando por completo a desigualdade social e a exploração econômica. Aprovado o Código de Menores, que inseriu o Direito do Menor no ordenamento jurídico brasileiro; tal Código institucionalizou o dever do Estado em assistir os menores que, em face do estado de carência de suas famílias, tornavam-se dependentes da ajuda ou mesmo da proteção pública, para terem condições de se desenvolver ou, no mínimo, subsistirem no caso de viverem em situações de pauperização absoluta, ou seja, não era qualquer criança que estava submetida a tal Código. 
  
A necessidade de educar, disciplinar, física, moral e civicamente as crianças oriundas de famílias desajustadas ou da orfandade instituiu uma perspectiva individualizante do problema do menor: a situação de dependência não decorria de fatores estruturais, mas do acidente da orfandade e da incompetência de famílias privadas, culpabilizando de forma quase que exclusiva a desestrutura familiar (VERONESE, 1999, p.28). 

No ano de 1941 - Foi organizado o SAM, Serviço de Assistência a Menores, através do Decreto-Lei nº 3779, com a tarefa de prestar, em todo território nacional, amparo social aos menores desvalidos e infratores, isto é, tinha-se como meta centralizar a execução de uma política nacional de assistência, desse modo, portanto o SAM se propunha ir além do caráter normativo do Código de Menores de 1927 (VERONESE, 1999, p.32). 

Dia 1º de dezembro de 1964 é criado a FUNABEM, Fundação Nacional do Bem Estar do Menor, pela Lei nº 4513, onde veio responder ao “clamor público” que passou a exigir, por parte do Governo, alguma solução diante do descrédito que se tornou o SAM. Era voltada para uma parcela estigmatizada da sociedade, ou seja, para os marginais. (VERONESE, 1999, p.33). 

O estado preocupado com o oferecimento das necessidades básicas, esquecia-se das necessidades integrais e utilizava a família desestruturada como a principal causa da marginalização da criança. 
Se resumia por meio do assistencialismo, em criar instituições próximas de famílias para “cuidar” das crianças, ou seja, estas eram retiradas de suas famílias “desestruturadas” e colocadas a conviver com pessoas que não conheciam tudo pelo “bem da nação” (CUSTÓDIO, 2009, p.19). 

O menor era um problema que o estado com toda sua “bondade” tentava resolver de sua forma, remetendo a culpa a família desestruturada da criança, se livrando por completo de qualquer responsabilidade. 

Na década de 80 com o fortalecimento dos movimentos sociais, o Brasil passa de um cenário estático e autoritário para crítico e democrático, onde diversos setores da sociedade passam a exigir a mudança de modelo. 
  
A miséria, desigualdade social, as precárias condições de vida da maioria das crianças foram alguns dos fatores que contribuíram para a transição da Doutrina da Situação Irregular pela Teoria da Proteção Integral. 
1988 - 5 de outubro de 1988 inseriu a concretização do novo direito, trazendo a democracia participativa e a formulação de políticas públicas como ferramentas no combate à exclusão social (BRASIL, 2010) 
Artigo 6º os direitos sociais, tais como o direito à educação, à saúde, ao trabalho, à segurança, à previdência social, à proteção a maternidade e à infância, bem como à assistência aos desamparados (BRASIL, 2010) 

Com a efervescência dos Movimentos Sociais no período de redemocratização do País, a Constituição Cidadão garante em seu Artigo 227 dispõe que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente, e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 2008). 

No que diz respeito a todo percurso histórico, é necessário salientar que o respeito à criança e ao adolescente era algo que não se percebia nos relatos, e chegaram ao ponto de serem considerados mini adultos cujos direitos, eram violados com recorrência e que, acreditava-se que a instituição correcional significaria a solução de toda a problemática que envolve a questão da Infância no Brasil, pois moldar a criança para viver em sociedade era uma prática que se usava inclusive com a criação das creches além das instituições que já existiam na época.  

Pedagogia social e a educação libertadora 

O Educador Paulo Freire, diante do quadro exposto à sua época e preocupado com a educação, cria desenvolve/redimensiona os conceitos de dialógico e de dialética. Ele sugere uma educação que vá além do seu tempo, que problematize as questões vivenciadas, tirando o educando da inercia e levando a reflexão dos temas abordados no processo ensino aprendizagem. Essa educação popular e social, que fazem parte da Pedagogia Social, trazem à memória a ação -reflexão – ação, para que não sejamos depositários em uma educação bancaria que precedeu Paulo Freire e tantos outros educadores. Hoje, com a possibilidade real da afirmação da Pedagogia Social, nos mais diferentes espaços educativos, reafirma-se em nossas mentes o que declarou Paulo Freire: “Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo”. 

Discorrer sobre Pedagogia Social significa valorizar o tema relacionado a tendência progressista libertadora, tratado na Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire. O autor enfatiza e propõe a educação (ou ação cultural) problematizadora, libertadora, que tem como pressupostos a humanização de ambos, educador e educando, o pensar autêntico, e, não, educação como doação, como entrega do saber. Isso prevê o companheirismo de ambos, educador e educando. Isto implica em um fazer pedagógico, conceito que representa a união entre teoria e a prática, reflexão e ação, em contraposição à Educação Bancária. 

Nessa perspectiva bancária, o educador é o que sabe; o que pensa; o que diz a palavra; o que disciplina; o que opta e prescreve sua opção; o que escolhe o conteúdo programático; o que identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional; enfim, é o sujeito do processo, enquanto os educandos, meros “objetos”. Infelizmente, o saber deixa de ser de “experiência feita” para ser de “experiência narrada ou transmitida”. Nesta visão distorcida de educação, não há criatividade, não há transformação, não há saber. Freire (2005a, p.68-69) acrescenta  também, que “só existe saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os outros.”. 

Importante destacar que no percurso do Pedagogo/educador Social, práticas utilizadas no passado necessitam de desconstrução e urge a construção do aprendizado sob todos os aspectos, como afirma Paulo Freire, “Ensinar não é transferir conhecimentos, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.” (FREIRE, 1997, P.21) 
   
Ele nos ensina a dialogar, em sala de aula, em frente ao computador ou em um grupo de amigos, sobre questões como a construção de uma escola democrática e popular. Ele nos provoca a sair da inércia para pensar sobre um mundo melhor, principalmente falando da responsabilidade que os professores e os educadores têm. Isso é Pedagogia Social!  

Pedagogia social: diversos olhares, mesmo objetivo 

Maria Stela Graciani (2014, pág. 20) diz que, na busca da transformação das condições de opressão que existe na sociedade, a Pedagogia Social se caracteriza como uma ciência transversal aberta às necessidades populares que busca cultivar suas raízes na perspectiva, baseada na cultura dos povos, de forma reflexiva, para se construir outras possibilidades e alternativas, sem que se destrua por completo o passado, contudo, promover a sua superação. 

Graciani (2014, pág. 21) registra também fatores relevantes concernentes a proposta intrínseca da Pedagogia Social. Para tanto, sugere a criação, inicialmente, de uma teoria renovada que diz respeito a relação homem – sociedade – cultura, com uma ação pedagógica libertadora, partindo do pressuposto do exercício de todos os níveis e modalidades da prática social. A mesma (GRACIANI, pág. 22) afirma que outro ponto importante é realizar no domínio específico da prática social com classes sociais populares, a partir de um trabalho político educacional de libertação popular, para que se garanta a intencionalidade de ser conscientizadora com sujeitos, grupos e movimentos das camadas excluídas.   

Outro ponto destacado pela autora é que a Pedagogia Social tem essa característica libertadora que emancipa o sujeito, cada vez mais nas suas possibilidades de exploração e construção de conhecimentos, levando-o a discutir, entender e aceitar, de forma digna, as regras e os limites necessários ao exercício da cidadania para a reconstrução da identidade[...]. Em termos gerais, a Pedagogia Social visa o desenvolvimento humano com base no autoconhecimento. (GRACIANI, 2014, pág. 22) 

Penso que Pedagogia Social é ampla, não é neutra, e é o Campo da Pedagogia que se constrói, dialoga, transita e agrega sistematicamente os conhecimentos e saberes construídos do Serviço Social, Sociologia, Filosofia, Psicologia Social, Educação Social, Educação Comunitária, da Educação Popular (especialmente, a de Paulo Freire), bem como os saberes de experiência produzidos pela humanidade. Os saberes de experiência são importantes mas não são suficientes, pois não carregam em si, a rigorosidade metódica necessária para que a ação não incorra em reducionismo. 

Partindo desse pressuposto, o autor Wallon (1975, pag. 379) afirma que “(...) não há forma de se dirigir à inteligência da criança, sem se dirigir a criança no seu todo”, temos que trabalhar o sujeito por inteiro no seu contexto social e histórico, e isso definirá a tênue matiz de uma educação com qualidade. Isso é Pedagogia Social! 

A autora Juliana Gama Izar (2014 p.11), em sua definição, diz que: 
É nessa linha tênue entre o que é e o que pode vir a ser que a Pedagogia Social se instala; é nos espaços obscuros e esquecidos pelo olhar da indiferença que ela age, é por aqueles que já não tem nada a perder que ela luta, porque entende, fundamentalmente, que todos fazem parte de uma única espécie - independente do gênero, da raça, da faixa etária, da condição socioeconômica, da opção política ou religiosa , a espécie humana. 

Em seu texto (ARAÚJO, 2013) pontua pilares para a construção desse Pedagogo / Educador Social, no sentido real de uma base sólida de atuação e seu papel na educação, quiçá na sociedade, de maneira plausível e com muitas reflexões: 
1º PILAR - Construção da sua própria identidade - Uma identidade que só faz sentido se atrelado ao outro, ou seja, ao aluno ou público alvo; 
2º PILAR - Aceitação - É preciso aceitar seu educando como ele é, com suas histórias e memórias, com seus textos e contextos de emergência. É possível que o processo de aceitação do outra passa, principalmente, pela própria aceitação, caso contrário, não passará de mero discurso de palavras soltas ao vento 
3º PILAR - Responsabilidade - Para além de se identificar com os educandos (ou público alvo), e neles se reconhecer e, aceita-los em sua legitimidade. O Educador Social deve responsabiliza-se por eles. Responsabilizarse a tal ponto por seu fazer pedagógico que será impensável não incluir o sucesso dos educandos [público alvo], no rol do próprio sucesso. 
Essa deve ser uma relação de pertencimento capaz de compreender educador e educando como partes integrantes de uma mesma realidade, não fazendo mais sentido a existência de um sem o outro” (ARAÚJO, 2013)

A autora Margareth Martins de Araújo (2013), em seu texto define:  

A Pedagogia Social como um componente da Pedagogia que se responsabiliza diretamente com a inclusão das crianças em situação de vulnerabilidade social no universo escolar. Quanto mais a população é entregue à própria sorte, maior se faz a necessidade da Pedagogia Social, que se traduz em um fazer pedagógico voltado para a realidade das crianças e adolescentes expostas a todo tipo de dificuldades oriundas de uma educação direcionada para um público com valores e necessidades bem diferentes. Dificuldades estas que não abrangem apenas o âmbito educacional como também o social, o político, e o afetivo.  

O conjunto de conhecimentos servirá para interações sociais na práxis educativa, bem como no desenvolvimento das atividades e práticas, no contexto sócio histórico, na perspectiva de instrumentalizar profissional, Pedagogo / Educador Social. São conhecimentos que perpassam pelos ambientes escolares e não escolares, com alternativas de construção de um fazer pedagógico social com possibilidades que objetivem formar um cidadão, a partir do respeito a sua realidade, com sentido e significado nas dimensões educacional, artística, cultural e social. 
  
O objetivo da Pedagogia Social diz respeito a uma disciplina pedagógica, que representa em sua essência, uma das ciências da educação. Significa pontuar que o que denominamos pedagogia social tem seu pertencimento à ordem do conhecimento, do aprender, aprender a aprender. Na aplicação de sua metodologia, é um conjunto de saberes, sejam teóricos ou técnicos ou experienciais, descritivos ou normativos, que tratam de um objeto determinado, que chamamos educação social (ROMANS, 2003. p.16). 

A Pedagogia Social não objetiva moldar o cidadão à sociedade, mas respeitar a sua história de vida no contexto em que estiver inserido. É campo de saberes que existe e é plena, tem um olhar integral do educando, recrudesce com o pressuposto de planejar e executar novas propostas que resultem em mudanças de paradigmas e transformação do indivíduo. Na consciência do devir, esse campo de saberes pode proporcionar a promoção dos direitos e deveres, além de incentivar a autonomia e o senso crítico, através de uma relação dialética e dialógica na qual, o educando seja o protagonista da própria história. 

Segundo Carlos Rodrigues Brandão,  

A educação existe onde não há escola e por toda parte pode haver redes e estruturas sociais de transferência de saber de uma geração a outra, onde ainda não foi sequer criado a sombra de algum modelo de ensino formal e centralizado. Porque a educação aprende com o homem a continuar o trabalho da vida.  (BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O Que É Educação. 48ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1995, pag.13)      

Pedagogia Social como afirmação 

No contexto pedagógico social, ser um Pedagogo / educador social é um grande desafio, pois se constitui em uma tarefa artesanal de construir uma ideia, uma obra, uma esperança futura, edificar saberes aprendidos e cultivados no cotidiano da vida em um movimento dinâmico e complexo entre seres humanos. 
Nessa perspectiva o que se espera do profissional sob todos os aspectos, que seja um mediador do diálogo do público alvo com o conhecimento, que possua uma visão crítica e consciente das causas geradoras do processo de exclusão e da injustiça social. Um Pedagogo Social que desenvolva ações conjuntas com a participação de todos no processo, quebrando as possíveis relações de poder hierárquico e autoritário, desencadeando práticas com respeito a realidade. Que antes de falar, ouça! 
Transcendendo a fala, o educador social, deve captar o mundo simbólico (signos e códigos), gestual (comunicação não verbal) e mágico-lúdico (no caso do público alvo), pois o ato de ouvir, observar o semblante e os sentimentos do nosso público, é um ato de profunda ternura e vigor permanente. Ter a consciência do momento em que o educando vive o mistério de seus dramas e sonhos é saber respeitar o momento do outro e sua individualidade.  

Considerações Finais 

Concluo esse artigo com a certeza da urgência da Pedagogia Social e, nesse sentido, o nosso papel se fortalece na busca de valorizar, resinificar, lutar por igualdade e justiça social e, perpassa pela importância de ser um com o outro. Isso é pedagogia social? 
Logo, na intencionalidade da afirmação da Pedagogia Social, do ponto de vista ampliado, significará desenvolver habilidades e competências na área de intervenção social, que produzirão resultados muito positivos, relacionados às questões transversais, com respeito à realidade e a identidade sócio cultural, dos atores envolvidos (educando e do Pedagogo/Educador Social). 
Em uma ação articulada com as famílias nas Comunidades que os circundam, ser um intelectual amoroso e afetuoso fará toda a diferença na perspectiva das construções das práticas, ações e do fazer pedagógico. 

Encerro com o Educador Paulo Freire  

O assistencialismo é uma forma de ação que rouba ao homem condições à consecução de uma das necessidades fundamentais de sua alma – a responsabilidade. No assistencialismo não há decisão. Só há gestos que revelam passividade e domesticação. (FREIRE, 1967, p. 57) 
  
REFERÊNCIAS 
ALVES, Rubens. Conversas com quem gosta de ensinar, São Paulo, Cortez / Autores associados, 1989  
ARAÚJO, Margareth Martins. Pedagogia Social Diálogos com Crianças Trabalhadoras 1ª. Ed. Volume 8: Expressão & Arte São Paulo, 2015. Coleção Pedagogia Social.  
______. Por que Pedagogia Social? Disponível em: FEUFF Site PIPAS - http://www.projetopipas.uff.br/index.php/eventos-organizados -. Acesso em 16/10/2014   
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2010.  
______. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial [da] União, Poder Executivo, Brasília, DF, 16 de jul. 1990.  
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